domingo, 3 de janeiro de 2010

Gafe? Desculpas? A diarréia de Boris Casoy

Asco, nojo, ojeriza. Eu senti ânsia de vômito quando assisti a esse vídeo repugnante. Boris Casoy revela o seu pensamento sobre os trabalhadores do serviço de limpeza da cidade. Pensei imediatamente em escrever um artigo sobre o caso, mas acabei enrolando. De hoje não passaria, ainda mais depois de ver aquilo que foi veiculado sobre o assunto nos principais jornais do país. “Bóris passa por uma saia justa”, “o âncora do Jornal da Band se desculpa pela gafe”, foi o que disseram a maioria das matérias que li sobre o assunto. Ora!! Façam-me o favor!!! Esse asqueroso episódio foi só um vazamento daquilo que o tal apresentador realmente pensa sobre a categoria de trabalhadores responsáveis por limpar a cidade onde ele vive e onde com certeza produz muito lixo.

Foi de uma vulgaridade que talvez tenha sido inédita na televisão brasileira. Eu pelo menos tentei aqui e não consegui me lembrar de um comentário tão pesado quanto esse, pelo conjunto de características que carrega. Estamos acostumados às distorções e deturpações da mídia quando se fala em MST, em cotas para segmentos que sofrem com desigualdades étnico-raciais ou de classe, movimento estudantil, outros movimentos sociais... enfim, é comum ver a mídia enviesando os fatos para favorecer seus patrões ou financiadores. Mas o caso de Boris é extremamente mais grave. Isso porque está carregado de muito mais elementos do que o velho preconceito de classe que geralmente vem maquiado. Foi um comentário extremamente covarde contra dois cidadãos simples, humildes, que, no exercício do trabalho, foram interpelados por um repórter que teve a idéia (excelente) de projetar suas vozes para o Brasil inteiro expressando o desejo de um ano novo feliz. Foi muito mais covarde do que as mentiras que a mídia dissemina sobre a classe trabalhadora em movimento. E não chega nem ao nível do preconceito incrustado na sociedade, como é comum de se ouvir, discriminação contra prostitutas, mendigos, bêbados de rua e etc. Foi a ridicularização de um segmento muito honrado da classe trabalhadora destilada igual veneno burguês, de um tapado que não consegue enxergar que aqueles trabalhadores limpam a sujeira que ele mesmo produz.

Olha só o conteúdo dessa verdadeira diarréia verbal: “Que merda.. (risos) Dois lixeiros desejando feliz natal... do alto das suas vassouras.. Dois lixeiros... (risos) O mais baixo da escala do trabalho...” Isso até finalmente ser interrompido por um funcionário do jornal. (Sem contar o erro de concordância) O peso dessas palavras está justamente no que se pode perceber de imediato: Por que isso? Por que é que foi uma “merda”? O que foi que eles fizeram a você ou à sociedade, Boris?

Além de tudo, o apresentador ainda comete um erro de tremenda estupidez. Classificar os trabalhadores da limpeza como sendo “o mais baixo da escala do trabalho”(sic) revela a total ignorância desse apresentador que não se contenta com sua função de âncora, e banca o comentarista de quinta categoria de toda notícia que passar no programa, e assim quer formar a opinião da população brasileira que assiste o jornal. De onde esse asqueroso tirou essa ‘escala do trabalho’? Além disso, vamos testar essa estúpida escala pra vermos. É simples: vamos imaginar o que seria de São Paulo ou do Distrito Federal sem os serviços prestados por esses trabalhadores por uma semana. Não preciso nem comentar. Agora, pra tirar a prova dos nove da estupidez do apresentador, eu proponho: vamos imaginar como seria o bem vindo ano de 2010 sem os infelizes comentários de Boris Casoy?

Pra piorar a nossa situação, todos os jornais que eu tive acesso traziam a matéria de uma forma que, pra mim, se fundamenta no corporativismo. “Boris Casoy pede desculpas pela gafe cometida contra garis no jornal”. Façam uma pesquisa no google, todas as manchetes estão dessa forma. Agora é o que? Boris Casoy é um coitadinho que cometeu um ‘deslize’? É claro que não. No que depender de mim, vai estar evidente pra qualquer um que as palavras de discriminação proferidas pelo apresentador foram sinceras, de caso pensado, e que sem querer vieram a público, humilhando toda uma categoria de trabalhadores em cadeia nacional. É lamentável o corporativismo descarado que quer botar panos quentes em algo tão asqueroso.

Mas se tem uma coisa que não pode passar desapercebida em toda podridão é a dimensão criminosa dos comentários de Boris. Não foi uma gafe, não foi ‘infeliz’, não foi ‘saia justa’ e nem qualquer outro eufemismo. O que foi dito configura-se um crime, injúria, difamação, que causaram danos morais à imagem daqueles dois homens - e mais do que apenas a eles, foi uma ofensa imensurável à imagem de toda uma categoria de trabalhadores, presentes no Brasil e no mundo inteiro.

Eu juro a vocês que quando fui pesquisar o assunto na internet, eu já esperava encontrar todo um rebuliço no sentido de processos contra Boris na Justiça. Pois por esse é o caminho que essa história precisa seguir a partir de agora. Ah se isso fosse com os assistentes sociais...

Mas pra não deixar de fazer a minha parte, mesmo não sendo um gari, eu encaminhei uma cópia desse texto a alguns endereços de sindicatos de trabalhadores de asseio, limpeza e conservação urbana que consegui, na tentativa de muni-los com uma perspectiva crítica de todo esse lastimável episódio, e de encorajá-los a tomar essa decisão de processar o apresentador preconceituoso pelo crime que cometeu.



“Isto é uma vergonha” ??? Não!! Isto é Falta de vergonha! E mais que isso: é um crime mesmo!



Esse fato é o típico fato bombástico de rolar cabeças. E em fatos de rolar cabeças, sempre rolam cabeças. Mas aí eu pergunto, será que vai ser a de Boris Casoy, um dos jornalistas mais conhecidos do Brasil? Mas o pescoço do trabalhador anônimo responsável pelo áudio certamente corre perigo – se não já tiver sido cortado. E esse fato previsível é mais uma demonstração preconceituosa da parte de Boris, que é apenas um representante de um conjunto de homens poderosos que nunca pagam pelos crimes que cometem, mas ao contrário, fazem recair sobre um outro conjunto de pessoas menos empoderado a capa da criminalização. Qualquer semelhança com a realidade atual dos políticos do DF e o episódio do massacre à população manifestante feito pela PM não é mera coincidência.

..Sabe... Eu também queria ser um gari. Mas não exatamente o gari que limpa a sujeira das ruas, mas um gari que limpasse as toneladas de lixo (des)informativo produzido por uma mídia como a que temos no nosso país.







* * * * *



Movimento Fora Boris Casoy

Olha só a que ponto chegou o caso: eu fui entrar no youtube hoje para pegar os vídeos e postar aqui no texto, digitei apenas youtube.com, e olha só como está a página inicial! Eu nem cheguei a fazer a pesquisa! Já existem dezenas de links para o vídeo, e só um deles que eu vi, ultrapassava as 800000 exibições!

Mandem emails para a Band pedindo que o preconceituoso, o discriminador, para que Boris Casoy suma das nossas Tevês. Acho que não dá pra ficar calado, calada diante dessa situação que é muito mais grave do que a mídia nos quis fazer parecer.

Os vídeos pra quem ainda não viu:







Olhem só a página inicial do youtube quando eu ainda nem tinha feito a pesquisa:







terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Que fique claro o jogo sujo

A política é assim. Ela é cheia de jogos, da malabarismos, de artifícios... fora o roubo, o peculato, o suborno, a mentira... enfim, a corrupção em geral. Muita gente poderia ler essa postagem e pensar que não é novidade nenhuma, mas eu estava pensando nisso e achei importante, achei que era meu papel deixar isso claro, mesmo que por meio desse blogue, que provavelmente não é acessado por aqueles que menos informação e conhecimento possuem. O que quero trazer aqui é um jogo sujo conhecido, utilizado recentemente por dois políticos.

Primeiro Arruda, depois Leonardo Prudente. Ambos lutaram para permanecer no partido. Afinal, quem não deve, não teme. E foi essa a imagem que tentaram passar. Não iriam sair, não iriam e pronto. Fizeram defesa por escrito, pediram tempo, tiveram tempo, e inclusive foram na Justiça pedir ainda mais tempo. Pra mim é nítido que esse tempo só servia para tentar abafar o caso e tentar se safar, mas eles disseram que era para elaborarem suas defesas.

Só que o tempo dessa vez não ajudou. A explosiva combinação de vídeos bombásticos e contínua mobilização social tornaram o clima insuportável para eles. O remédio? Plano B, o famoso ‘pede pra sair’. “não.. não foi a situação insustentável, ,não... eu saí pra preservar os colegas de partido”. Colegas? Que colegas? Até ontem Durval era colega de todos e todos eram colegas de Durval, mas hoje ele passou para um crápula. Colegas? De partido!? Ora, nessa política aí não existem colegas. E como é que se faz para preservar um partido que te chuta o traseiro pra fora?



Arruda pediu tempo, depois se apressou em sair. Prudente entregou sua defesa, mas mandou depois um fax (?) escrito a mão pedindo também seu arrego. Que fique claro que o ditado permanece verdadeiro. Quem não deve, não teme. Que fique claro que quem fosse acusado erroneamente e tivesse uma vida idônea, sairia fortalecido de uma injúria tão pesada quanto essa, se injúria o fosse.



Cá entre nós, aquele diálogo entre Durval e o governador é a maior evidência de todas pra mim. “Quando você for divulgar, me avisa antes, que é pra eu sumir do país ou dar um tiro na cabeça ou matar você” (mais ou menos isso). As evidências são manipuláveis, fatos podem ser ocultados, mas um diálogo desse aí revela a profundidade da coisa a partir da dimensão da alma humana atormentada.



Falando em alma, outra situação que pra mim é gravíssima, mas a grande mídia não deu importância, foi aquela ocasião da oração. Todo mundo ficou boquiaberto com a cena, mas não é da oração que estou falando. É sobre o pós oração: todo mundo saindo, cada um sabendo de si, e aí o Prudente, quase como que olhando pra câmera , diz “que paulada!”, com um sorriso flagrante. Que paulada...





Quero desejar a todo mundo que lê o Carta um ano novo cheio de paz, esperança e perseverança. Um abraço!

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Um desafio à pedagogia do movimento

Somos humanos. E uma das maiores marcas do que é ser humano é a aprendizagem. Talvez venha daí o meu fascínio pela educação. Ao contrário dos demais animais, nós nascemos completamente ignorantes e incapazes, mas nos tornamos conscientes e capazes por meio da aprendizagem. O ser humano é, por excelência, o animal da aprendizagem. Mas a pergunta que faço é: o que isso nos provoca, orgulho ou vergonha?

A nossa sociedade dicotomizou a relação de aprendizagem. Existem aqueles que ensinam e existem aqueles que aprendem. E como já dizia o mestre Foucault, e antes dele o Mestre Jesus, conhecimento é poder. E isso não se pode esquecer, pois, se conhecimento é poder, e os humanos adoram poder, então tem muito mais coisa do que aparenta essa coisa de aprendizagem.

Estou dizendo isso pra mostrar que é essa divisão entre o que ensina e o que aprende não é casual. Mas essa relação revela, ainda, um enorme contrasenso da humanidade: se a grande marca do ser humano é aprender, por que então o que todos querem é ensinar?



* * *

O movimento contra a corrupção é pedagógico. Ele tem ensinado a sociedade de muitas maneiras, em muitos aspectos, aos mais variados segmentos de pessoas. Mas tem um segmento muito importante da sociedade que pode perder o bonde do aprendizado. Falo justamente do grupo maior, o mais presente e responsável pela vida desse movimento. Falo do grupo que poderia chamar de grupo dos movimentos sociais. O que chamo de movimentos sociais aqui compreende partidos políticos, grupos autônomos de luta, de trabalhadores, estudantes, sindicatos, grupos de etnia, gênero, ambientalistas, socialistas, democratas, anarquistas, etc. Os grupos que já estão acostumados a lutar há mais tempo. Boa parte desses grupos está hoje unida num grande movimento social, que é esse movimento contra a corrupção, cuja luta se dá no DF, mas possui repercussão nacional.

E é muito bonito ver partidos rivais construindo em conjunto. Grupos que sempre atuaram em frentes separadas hoje estão juntos em prol de uma causa só. E o momento maior disso tudo foi o tempo de ocupação da Casa do Povo, vulgo Câmara Legislativa do DF. É que ali se dividia mais do que momentos de luta. Dividia-se ali o espaço, a morada. Além disso, havia assembléias diárias, onde grupos que historicamente são separados estavam deliberando em conjunto. O espaço era um só, a comida era uma, a sujeira e limpeza concerniam a todos, e a força daquilo dependia de todos ali, pois todos sabiam que o seu grupo sozinho não era forte o bastante pra sustentar a ocupação.

O movimento ensinou que esses grupos, que são separados e às vezes rivais, são mais unidos do que se acreditava. O movimento ensinou que os grupos que lutam ainda são poucos para vencerem sozinhos, e que só a união dessas forças é que pode fazer vislumbrar no horizonte a vitória. O movimento ensinou que dividimos muita coisa, o movimento ensinou que é preciso humildade para ouvir o outro, sendo que o outro é muitas vezes um antigo rival. O movimento ensinou a pôr em questão se nós somos mesmo rivais.

O movimento ensinou? Bom, ele ao menos tentou. Ele foi, e tem sido, mais do que claro nos seus ensinamentos. É o movimento que tanto ensinou aos demais, ensinando lições a si mesmo. Mas temos aí um problema. Para a aprendizagem, não bastam apenas as grandes lições, por maiores que sejam. É um problema que se remete ao que foi discutido no início do texto: Será que o movimento que a tanta gente ensinou está realmente disposto a aprender consigo mesmo?

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

O Movimento contra a corrupção é pedagógico

É um movimento que exige a punição de todos os corruptos que foram evidenciados recentemente. Esse movimento, que se estabeleceu ao longo dessas mais de duas semanas desde o estouro do mensalão do democratas, do arrudoduto, ou do que quer que se chame, é um movimento que vem buscando um objetivo bem claro, mas, de lambuja, está atingindo um outro: a educação cidadã e o ensino prático acerca do que é fazer valer um Estado Democrático de Direito.
Se isso não está claro de imediato, já dou logo um exemplo quentinho, o de hoje. Manifestantes, aos quais a mídia insiste em chamar de ‘estudantes’, numa clara estratégia de diminuir a representatividade de um movimento plural e popular, foram hoje assistir à plenária na Câmara. Como o analfabetismo democrático impera neste DF, o que mais aconteceria? Foram barrados na porta. O vídeo da tv de Paulo Octávio quis mascarar a batalha e fazer parecer instantâneo, mas não foi bem assim. A mídia é uma aluna teimosa, mas quando aprender, beberá da amarga vergonha de se posicionar em desfavor do próprio povo. A situação era a seguinte: queriam impedir o povo de entrar na própria casa para ver de perto o que estaria acontecendo por lá. Qual foi a lição ensinada? Aquela câmara ali é casa do povo por direito e o povo não pode ser impedido. E o exercício de fixação? Entrou-se na marra. Botados pra fora? entrou-se de novo. Pra fora na força do braço? pra dentro de novo, na força do saber e o do poder que é do povo que luta.
O povo em movimento foi pras ruas quando foi humilhado demais. O batalhão de um governo fascista tentou nos tolher o direito. Ora, a rua é do povo, e às ruas o povo não renunciará! Isso ficou ensinado à maldita PM (isentas as exceções), que hoje nos teme quando viu que a eles nós não temeremos – e depois que aprendeu a lição. A lição de que é o povo o dono de tudo, que das ruas não arredaremos, mas que faça-se o que se exige por parte do povo, e o primeiro pilar dessa máfia já caiu parcial.mente. O povo deu corpo ao seu grito por justiça, e o corrupto pediu pra sair.

















E ainda são muitas as outras lições. Pessoas que nunca se sentiram sua voz ecoar puderam fazê-lo nos atos nascidos na praça Zumbi no Conic, redimensionados na Rodoviária, e eclodidos nas ruas monumentais do DF e nos edifícios do poder (e da corrupção). Foram pessoas que aprenderam um pouco mais sobre elas mesmas, e o poder que elas têm dentro delas. E tem muitas outras que estamos a ensinar (e a aprender), mas eu quero que chegue logo o dia em que a lição final será aprendida por todos – e alguns aprenderão amargamente, aqueles que cairão de seus mandatos erigidos com a podridão da corrupção, que a todos nós ofendeu.

sábado, 12 de dezembro de 2009

O Fora Arruda visto de dentro: algumas nuances

Quem não se movimenta não percebe as correntes que o prendem, é uma brilhante assertiva de Rosa Luxemburgo. Um tanto desconhecida pela maioria, é um pensamento acertado, razoavelmente difundido e compartilhado entre os movimentos sociais de luta por um mundo mais justo ou mais ético, ou um mundo melhor, chame como quiser. Eu sempre lembro dessa frase quando vejo uma luta acontecendo. Uma coisa que me chama atenção é pensar em por que as pessoas que estão tão perto conseguem permanecer tão distantes.
No ato em que o exército policial tentou barrar o movimento mas acabou lhe impulsionando, houve vários momentos em que paramos o trânsito ou transitamos entre os carros em movimento. É impressionante como as pessoas atravessavam o ato como se não vissem nada. Alguns, inclusive, nem para o lado olhavam. Sempre em frente, sempre perseguindo o alvo. 'Que alvo? Bom, o alvo... o alvo eu não sei, até mesmo porque estou ocupado demais perseguindo o meu alvo pra pensar nessa coisa de alvo'.

Alguns buzinavam, mas era minoria. A maioria passava indiferente. É interessante pensar no porque de as pessoas estarem indiferentes. Há poucas semanas atrás, o movimento era a greve da minha categoria. Estivemos naquele mesmo lugar, pleiteando uma reestruturação da carreira. E as pessoas seguiam indiferentes. No máximo olhavam, aqueles que viam em nós um tipo de entretenimento, até pra quebrar a rotina enfadonha do trabalho ou do percurso. Tudo bem, não quero fingir aqui que as categorias são unidas no mundo do trabalho. Mas o que acontece hoje em Brasília é algo que atravessa a todos. O governo governa o DF, e de todos roubou. Contra todos praticou vários crimes, os que sabemos e os que não sabemos, os que são tipificados crimes e os que não são, como o crime de debochar da nossa cara dizendo que é inocente, enquanto no fundo no fundo, pensa “essa população do DF tem a cabeça tão fraca que além de aceitar as desculpas, esquecerá rapidinho”.
Mas a pergunta que me faço é: Se contra todos praticou vários crimes, como é que as pessoas conseguem permanecer tão indiferentes assim? A grande nuance é passar por pessoas em igual situação de ultraje, e ver as caras de estranheza, ou de impressionadas, como se estivessem vendo um grupo de seres de outro planeta. “Não é comigo, é a frase que extraio de tais expressões”.
Na carreata de hoje, uma picape pampa de loja de vidros passou por mim, e o motorista desacelerou, e atravessou a mulher do banco de carona para me dizer "tirar um ladrão pra depois vocês entrarem lá e roubarem também!?" Quem dera o caminho para o povo alcançar o poder fosse rápido assim...

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Mafiosos no Poder – Série Arruda e corruptores

Esses dias eu dispus de pouco tempo pra gastar por aqui. É que esses tempos são tempos de ruas, e é por isso que as lutas se deram nas ruas e não na internet. Sem querer desmerecer a ferramenta importante que a internet tem sido nessas lutas, mas um dos mais graves erros do cidadão de hoje é transformar a net, que é uma ferramenta de luta, na própria luta em si.

Mas sem mais delongas, dou início à série sobre a corrupção no DF. Chamo de série porque é a isso que irei me dedicar a escrever nos próximos dias. E como o tempo tem sido escasso e as voltas do mundo parecem encurtar a cada dia, eu não vou querer gastar tempo com textos com Início, Meio e Fim. Esse aqui é o início. O meio é tudo aquilo que vem a partir de agora. E o fim, ah, o fim... o fim a Deus pertence – mas Ele que bobo não é já tratou de avisar que o fim que você deseja do céu não cairá. E se é assim, mãos no arado.

Um último aviso. Isso aqui não é série bonitinha igual da Globo, não. Então, apesar de ser série, não necessariamente tem ordem ou lógica, por mais estranho que isso soe.



Faroeste Calango



Já vou logo avisando a você: O DF virou uma terra sem lei. Melhor, um faroeste, onde mandam pistolões e o restante se borra ou leva chumbo. Então, manifestantes munidos de vergonha na cara e consciência ético-política se viram em guerra contra uma frota militar de cavalos, cachorros e o mais temível dos animais, o ser humano. O humano é temível como temíveis fomos nas ruas contra a corrupção que esfregaram na nossa cara. O humano é temível também quando não reconhece no outro o seu semelhante, e o massacra com tiros e cassetetes. Mas eu vou te deixar animado: eu provei e são de borracha. E vai ser preciso mais para frear a força da nossa insurreição. Já a manada de cavalos estava calçada com ferro mesmo. Porém, ao contrário do que imaginam, isso só nos enche de motivos para lutarmos com ímpeto e mais ímpeto. Os que achavam que as cavalgadas nos iriam desanimar acordaram debaixo de chuva de ferraduras sobre as próprias cabeças.

Na terra do faroeste, polícia bate em criança num ato pacífico, e adolescente agora apanha de professora em vez de aprender lição de cidadania. No faroeste, o bandido que aumentou mil por cento o seu patrimônio é o mocinho, e os que foram roubados, lesados por essa sujeira de cortar a carne, não podem gritar coletivamente a sua indignação, sem ter que levar pancada. A terra do faroeste enfiou a ditadura militar num fundo bolso.

E na terra do faroeste calango, me avisam para que eu tire os dizeres do inconformismo estampados no carro, alertando que levarei multa ou que as chefias irão me punir. Ora! Pro inferno com aviso de merda! Não vou pagar simpatia pra ninguém! E se vier de gracinha, já vou avisando: eu vou dar enxaqueca e trabalho. E sozinho eu não tô. Nem eu e nem a companheirada que foi presa, e nem a que foi "só" machucada, e nem as crianças. Companhia uns pros outros, na luta e até a vitória!

domingo, 22 de novembro de 2009

A herança dos assaltos de Palmares



Andei um tanto ocupado esse últimos dias com a greve, e aí acabei não dando a visibilidade que acho que esse dia merece. Na verdade não é só por merecimento, é por amor mesmo. Meu sangue ferve e até as lágrimas descem quando o assunto é o povo preto.

Acabei não escrevendo no dia, mas é como acabei de dizer: eu preciso dar Visibilidade a esse tema.

Há um bom tempo atrás, mais de uma década, o instituto DataFolha lançou uma grande pesquisa sobre a questão da desigualdade racial no Brasil. Os resultados acabaram dando a idéia exata ao título, e o estudo foi intitulado Racismo Cordial.

O que seria o racismo cordial? Vou tentar expressar o espírito do conceito com um dado* brutal: Apenas 5% das pessoas entrevistadas admitiram ter atitudes racistas, mas 95% das pessoas afirmaram que conhecem ao menos uma pessoa racista. Ou esses 5% são mais conhecidos que nota de dois reais, ou existe algo muito estranho entre os 95% restantes.

O racismo cordial é um tipo de racismo invisível. É como o vento que não se vê mas a todos se faz sensível. O racismo no Brasil é invisível, o genocídio negro persiste até hoje e segue invisível à maioria, o Dia da Consciência Negra ainda carece muito de visibilidade. Há uma luta já histórica de fazê-lo feriado, mas é uma luta que querem tornar invisível.

O dia 20 de novembro tem a ver com Zumbi e Palmares. E da intangível herança de Palmares, eu quero registrar apenas por alto os assaltos**. Um deles é a herança quilombo, e o outro, as cotas nas universidades e outras instituições.

















Qual é a herança quilombo a que me refiro? Acredito que a maioria pensa em algo abstrato, alguma característica, etc. e tenho certeza que muita gente simplesmente desconhece o que vou falar: a herança quilombo são os próprios quilombos. Os quilombos que existem até HOJE. Mas agora o nome mudou um pouco, para Comunidades Quilombolas, ou Comunidades de Remanescentes de Quilombo. Existem comunidades de filhos, de netos e bisnetos de escravos até hoje no país, resistindo, lutando pela demarcação de suas terras que até hoje o Estado racista não reconhece o pertencimento. Para os mais desinformados, não muito longe do DF existem os Kalungas, um quilombo aqui nesse Goiás (do qual o DF finge que não pertence).

O outro assalto é a instituição de cotas para negros em universidades e outros espaços. É difícil de conceber, mas na universidade pública, a população negra era de apenas 2% do total, conforme revelava o Ipea. Hoje, com 20% das vagas, que muitas vezes são disputadas com brancos que querem nos destituir de nossa conquista chegando afirmar que são negros sem o ser, garantimos um espaço que já desencadeou um ciclo de transformações na sociedade brasileira.

E onde entra a herança do assalto nessa história? É basicamente o seguinte: tudo aquilo que a população afro-brasileira conquistou até hoje nessa terra desde que foi raptada de África foi de assalto. Nesse sentido, até a própria liberdade teve que ser tomada à força das mãos dos colonos. Quilombo foi a forma que os assaltantes da liberdade deram, quando a coletivizaram. E até a própria terra onde essa liberdade assentava seus pés teve que ser tomada dos opressores. Bem assim as vagas de estudo e trabalho. Chega de um povo apenas construir e o outro apenas usufruir. Vamos partilhar o segundo hábito, nem que seja pegando uma parte e dizendo: essa aqui é para este povo.



Viva Zumbi! Viva Palmares!

Viva esse pigmento que dá esse tom lindo à nossa pele, apesar das consequências!





* Eu arredondei 5% e 95% porque não lembro o número exato. Se eu não me engano é ainda mais acentuado, tipo 98% e 2%.

** Dois assaltos recentes estão registrados nesse blogue. Veja clicando aqui